sábado, 14 de setembro de 2019

JESUS E O CONCEITO ERRADO DO FUTEBOL BRASILEIRO


No decorrer desta semana, um jornal carioca, que não me recordo agora o nome, divulgou uma entrevista com o atual treinador do Flamengo, Jorge Jesus, realizada, se não me engano, ano passado, em outro país. Não sei se o pensamento revelado na entrevista modificou ao chegar ao Flamengo. Pelo que li, muita gente gostou e aprovou o que disse. Como um jornalista, por exemplo, de um canal fechado, que tem dado declarações polêmicas, não sei com que intenção, mas penso que é um direito dele. O jornalista disse que o comentário de Jorge Jesus “incomodou muito os treinadores brasileiros, pois tocara na ferida da classe”.

O comentário, minha gente, se refere a um suposto adormecimento do futebol brasileiro após conquistar as 5 estrelas. Jesus disse que o futebol brasileiro “deitou nas glórias do passado; não estudou e não evoluiu taticamente e fisicamente”. Eu me assustei e me surpreendi, pois começava a fazer de Jorge Jesus um bom conceito como treinador. Dentro dos limites que conheço do futebol português, caso me fizessem a mesma pergunta, diria que, calcado em Cristiano Ronaldo e mais três ou quatro bons jogadores, a última geração portuguesa forneceu ao mundo uma boa equipe conquistando a taça da Europa e tendo boa participação nos torneios e nas Copas que disputou sob o comando de Fernando Santos, ao meu ver um excelente treinador, que comandou e armou muito bem a seleção portuguesa. Expôs um trabalho simples e eficiente, dentro dos padrões em que atua o futebol português.

Sobre o que disse Jorge Jesus, eu diria, na gíria brasileira, que ele pisou na bola. Nem todos os treinadores ou profissionais que estão em seu melhor momento são felizes no que dizem. E, me permita, Jesus, você disse uma bobagem sem tamanho. Em 2006 (aí sim uma seleção desarrumada em sua escalação e definição tática e técnica), 2010, 2014 e 2018, o que faltou foi o talento de 2002, 94 e nos anteriores das conquistas brasileiras.

Vamos por partes, na parte física há muito tempo as seleções brasileiras não “abrem o bico”, não são superadas pelo melhor condicionamento físico dos adversários. Tampouco pelo lado tático. Sempre disse que é um erro grosseiro a linha de que “o treinador chega no clube com sua proposta tática pronta e trabalha para que os jogadores se encaixem nela”. É justo o contrário, companheiro. É diante do material que você dispõe que você monta seu esquema tático e até físico. Todo futebol , assim como outros esportes, cito o basquete por exemplo, a raiz americana não aceita modificações pois ela deu certo. E ai de quem propuser alguma modificação nela. É o estilo americano de jogo. Pode contar com melhores ou piores jogadores. Mas não se mexe na raiz, na base e na essência de uma seleção.

Em nossas 5 estrelas, Jesus, não faltam vídeos que te provem que a qualidade técnica foi muito superior a dos adversários. Meu comentário de forma alguma despreza o estudo, a fisiologia, a fisioterapia, a medicina esportiva, a preparação física, a parte teórica. De forma alguma. Mas não é em razão dela que decaímos. É justo por tentarmos priorizar o que as outras seleções fazem há muito tempo, usando a parte física, tática e organizacional da melhor forma possível, que estamos entrando pelo cano.

Você dirige um time hoje que tem dois jogadores altamente técnicos e velocíssimos no ataque, abastecidos por dois outros extremamente técnicos e dotados de muitos recursos. A diferença do elenco que lhe deram pra trabalhar hoje para os demais clubes é quilométrica. Isso não anula sua capacidade e sua competência. Mas fica provado que anular seu time que tem como propósito técnico o seu abre alas é bastante difícil, concorda?

O técnico Vanderlei Luxemburgo, que comanda um time fraquíssimo e envolto em políticas sinistras, como o Vasco da Gama, também partilha desta opinião que expus. Muito experiente, Luxemburgo já dirigiu times no exterior de primeiro nível, conhece perfeitamente os cursos e o estudo que é feito com os técnicos que saem do Brasil e tentam se aperfeiçoar no exterior.  O técnico Muricy Ramalho ratifica o mesmo pensamento. Resumindo, ninguém saiu daqui pior e voltou melhor.

Vale a pena citar um comentário muito feliz de Luxemburgo: “Houve uma mudança dentro do futebol brasileiro, uma preocupação muito grande com a tática, e a essência do empirismo brasileiro foi esquecida. Não estamos jogando o futebol brasileiro”. Eu assino embaixo, Vanderlei. E uso um exemplo simples: pergunte aos nossos adversários do passado e do presente o que eles mais temiam e temem jogando contra o futebol brasileiro, se é uma tática inovadora ou um drible desconcertante.

Mas a maioria está querendo aparecer mais que o drible, mais que o jogador, mais que o jeito brasileiro de jogar, distorcendo nossas raízes, nosso estilo e já escolhendo na base dos clubes jogadores pelo lado atlético e não pelo lado técnico. E quem os escolhe em via de regra são preparadores físicos e muitas vezes estagiários ou apadrinhados.

Para fechar meu raciocínio: enquanto acharem que o futebol começou há 10 minutos e que o estudo é carro chefe do futebol jogado no Brasil desde sua origem, nos igualaremos a quem só pode estudar pra melhorar. A quem tem a cintura dura e não foi abençoado com a magia responsável por 5 títulos mundiais e o maior número de vitórias de uma seleção de futebol no mundo.

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