Gleb Garanich (Reuteurs) |
É muito triste escrever após mais uma derrota mundial do
futebol brasileiro. Hoje partiram mais duas equipes sul-americanas que juntas
somam 7 títulos mundiais, Brasil e Uruguai. Antes já havia partido a
Argentina, com mais dois. O que está errado, gente? Incansavelmente tenho
postado aqui nas minhas crônicas, quem acompanha pode constatar, no caso do
Brasil, nossos inúmeros problemas e defeitos. E o pior deles é uma mentalidade
artificial que foi construída no nosso futebol.
Alertei várias vezes, chegando a cansar o leitor, que não
jogamos amistosos suficientes e contra outros tipos de escolas, senão as sul-americanas,
ou no máximo, muito recentemente, algumas europeias como Áustria, Croácia,
Alemanha e Inglaterra, que atuou com o time reserva. O que foi muito pouco.
Isso contribuiu para uma falsa impressão de que tínhamos uma equipe pronta.
Tínhamos sido testados em parte. Tínhamos um comando trocado há apenas 2 anos e
seguíamos com uma federação e seus mandatários apodrecidos, sem moral alguma. A
ponto de seu ex-presidente sequer poder acompanhar os jogos fora do país sob o
risco de ser preso.
Naturalmente aparecerão listas de culpados, como é comum
no Brasil. Acusar, nominar, escolher o bode expiatório é comum no Brasil.
Tentar entender que as raízes do futebol brasileiro não nasceram pra se adaptar
à ciência e ao pragmatismo é que são elas. Nosso futebol nasceu e venceu
criativo, ofensivo, dinâmico, driblador, catimbeiro, não imaturo ou comandado
pela opinião pública e pelos empresários de jogadores com fartura para todo
lado.
Nosso futebol, meus amigos, não aceita soluções “quebra-galho”,
tipo: “Não está acertando aqui, entro com Firmino. Não deu certo lá, eu ponho o
Douglas Costa. Eu preciso ganhar, lanço mão do Renato Augusto”. Pobre Renato
Augusto. Pobre Coutinho. Pobre Gabriel Jesus. Pobre Alisson. Pobre Miranda. E
alguns que eu possa estar esquecendo ou fazendo injustiça. Abrir mão de armar
um meio campo com Renato Augusto e Philippe Coutinho juntos, ter um Neymar sem
posição fixa (o mesmo acontecendo com o Willian), é, para muitos, bastante antiquado,
não? É ali que se começa o domínio do jogo e criação de todas as ações
ofensivas. E tínhamos jogadores com habilidade suficiente para isso no elenco.
O meio campo que foi bombardeado pelas forças teóricas, físicas e científicas
que invadiram nosso futebol.
Sei que a opinião pública vai ser covarde em direcionar
suas baterias contra Neymar, o próprio Fernandinho... A culpa não é deles. A culpa
é do modelo adotado por quem os dirige. Fernandinho sequer poderia ser
convocado. E Neymar já dá sinais há muito tempo (puxa vida!), há muito tempo,
que precisava de alguém que lhe ajudasse. Tirasse dele o que ele tem de melhor.
Fosse sincero com ele e com toda atitude que necessitasse ser tomada para
digerir seus incontáveis excessos. Bola? Ele tem demais e sempre teve. Foi muito
triste vê-lo várias vezes perdido em campo. Foi muito triste ver o meio campo
da Bélgica envolvendo o inexistente meio campo brasileiro, praticamente formado
por volantes, com bola de pé em pé, na iniciativa do genial artista da Bélgica,
Hazard, que deu um verdadeiro show na nossa seleção. Se há anos ao invés de uma
camisa vermelha envergasse uma da seleção brasileira, ora, ora, tranquilamente
mais um virtuose que saiu do nosso forno direto para os gramados.
Teríamos perdido hoje por Gabriel Jesus não ter se
infiltrado nas costas de Willian, como pediu Tite em uma leitura labial
capturada pela TV? Foi por causa do excelente goleiro belga? Antes fosse. Nós
não perdemos por causa disso, não. Perdemos por um conjunto de erros de um
futebol viciado em pragmatismo, em teorias que abriram mão da nossa arte, da
nossa criatividade e do nosso drible. De comissões técnicas que parecem um parlamento.
Com o agravante de dezenas de jogadores que só são convocados porque jogam no
exterior. Mas, ninguém leva em conta se seu amor a nossa camisa vai ficando pelo
caminho, sendo camuflado por milhões de dólares e euros. A África já revelou
grandes jogadores e até hoje não se firmou por causa desse fenômeno social. Na
hora de nossa convocação, fala mais alto quem tem empresário mais forte e joga
fora do país. Apesar de hoje em dia não termos deixado no Brasil tantos
jogadores de mais qualidade do que os que estavam na Rússia, muitos deles
fizeram falta e jogam bem mais do que os que jogaram lá. Fatalmente a maioria
adere a comercialização e globalização do futebol.
O Brasil perdeu a magia, gente. Ou melhor, condenaram e
expulsaram o dom da magia. Mesmo com o futebol em vários momentos provando o
contrário. Como disse a preparação física da seleção brasileira a dias do
início da Copa: “Hoje nós não temos mais jogadores de futebol. Temos atletas”.
É verdade! Com algumas exceções, vocês disseram a verdade. E o resultado, meus
camaradas, é esse aí que vimos e estamos vendo há muito tempo. Não precisamos
de poetas e filósofos comandando jogadores de futebol. Mesmo que inteligentes,
cultos e de bom senso. Precisamos de técnicos de futebol que respeitem os
caminhos da bola e a real essência do nosso verdadeiro futebol. Porque no campo,
Tite, a sorte, o “aleatório”, é quando se vê um jogador de 95kg da Bélgica,
Lukaku, dar um nó em Fernandinho e Paulinho, no meio campo e ligar De Bruyne,
chegando ao fatal segundo gol.
Com relação ao Uruguai e França de hoje, passei a ver o selecionado
francês, que contraria em parte o que disse acima porque sua imensa maioria no
elenco é naturalizada ou descendente direta de africanos, como favorito. No
entanto, eles amam a França e se doam, como fizeram hoje. E a França tem
planejamento, tem metas, um bom treinador que jogou futebol e, que eu saiba, o
presidente de sua federação não é procurado pela polícia. Apesar de considera-la
favorita, pode haver de tudo. Pode haver um campeão que nunca tenha posto as
mãos nessa taça, o que não seria para mim uma surpresa.
Quanto ao Uruguai, que jogou o que pode, fez o que pode,
dentro de sua escola e comandado por um dos melhores treinadores do mundo,
sentiu a ausência de uma de suas poucas estrelas e foi derrotado com justiça
pela França. Lamento por praticamente o fim de uma geração de bom futebol que
representou a celeste olímpica nas últimas Copas.
Vamos aguardar o desfecho das quartas de finais e a vinda
das finais. Foi o que sobrou para assistirmos na nossa Samsung. Isso nós que
ficamos aqui. Aos brasileiros que foram a Rússia, salvo os que foram desfilar
falta de educação e respeito (como uma grande parte já havia feito aqui, em 2014,
com motivações extracampo e de cunho político), desejo um bom regresso ou um
bom final de Copa, dentro da medida do possível.
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